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'SE CALAREM AS VOZES DOS PROFETAS AS PEDRAS FALARÃO'








terça-feira, 24 de agosto de 2010

"Só Deus basta. Quem encontrou a Deus, encontrou tudo",

por PAPA Bento XVI

O homem sabe que não pode satisfazer sozinho as suas próprias necessidades. Enquanto permanece na ilusão da autossuficiência, experimenta que não pode bastar a si mesmo. Tem necessidade de se abrir ao outro, a algo ou alguém que possa dar a ele o que lhe falta. Deve, por assim dizer, sair para fora de si mesmo, em direção ao que seja capaz de preencher a amplitude de seu desejo.

Como o título do Meeting destaca, nem tudo é o objetivo final do coração humano, mas somente as " grandes coisas". O homem é frequentamente tentado a se apegar às pequenas coisas, àquelas que dão uma satisfação e um prazer "barato", àquelas que satisfazem por um momento, coisas tanto fáceis de obter quanto, em última instância, ilusórias. No relato evangélico das tentações de Jesus (cf. Mt 4,1-4), o diabo insinua o que seja o "pão", isto é, a satisfação material para satisfazer o homem. Essa é uma mentira perigosa, porque contém somente uma parte da verdade. O homem, de fato, vive também do pão, mas não somente do pão. A resposta de Jesus revela a falsidade última dessa posição: "Nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus" (Mat 4,4). Só Deus basta. Somente Ele satisfaz a fome mais profunda do homem. Quem encontrou a Deus, encontrou tudo. As coisas finitas podem dar vislumbres de satisfação ou alegria, mas somente o Infinito pode preencher o coração humano: "inquietum est cor nostrum, donec requiescat in te - nosso coração está inquieto enquanto não repousa em Ti " (Santo Agostinho, Confissões, I, 1). O homem, no fundo, precisa apenas de uma coisa que contém tudo, mas primeiro deve aprender a reconhecer, também através de seus desejos e anseios superficiais, aquilo que realmente necessita, aquilo que verdadeiramente deseja, aquilo que é capaz de satisfazer a capacidade do próprio coração.

Deus veio ao mundo para despertar em nós a sede das "grandes coisas". Isso é evidente naquela passagem evangélica da riqueza inesgotável, que narra o encontro de Jesus com a mulher samaritana (cf. Jo 4, 5-42), de que Santo Agostinho nos deixou um comentário brilhante. A mulher samaritana vivia a insatisfação existencial, de quem ainda não encontrou aquilo que procura: havia tido "cinco maridos" e, naquele momento, convivia com outro homem. Aquela mulher, como fazia habitualmente, havia ido buscar água no poço de Jacó e encontrou Jesus, sentado, "cansado da viagem", no calor do meio-dia. Após lhe ter convidado para beber, é o próprio Jesus quem lhe oferece daquela água, e não qualquer uma, mas uma "água viva", capaz de saciar a sua sede. E assim ele ganhava espaço "pouco a pouco [...] no coração dela" (Santo Agostinho, Comentário ao Evangelho de João, XV, 12), fazendo surgir o desejo de algo mais profundo que a simples necessidade de satisfazer a sede material. Santo Agostinho comenta: "Aquele que pedia para beber, tinha sede da fé daquela mulher" (Ibid., XV, 11). Deus tem sede da nossa sede por Ele. O Espírito Santo, simbolizado pela "água viva" de que falava Jesus, é exatamente aquele poder vital que sacia a sede mais profunda do homem e lhe dá a vida total, aquela vida que ele busca e espera sem saber. A samaritana, em seguida, deixou o cântaro no chão, do qual "já não precisava mais, e certamente se tornara um fardo: estava ansiosa agora para beber somente daquela água" (Ibid., XV, 30).

Também os discípulos de Emaús viveram frente a Jesus a mesma experiência. É também o Senhor quem faz "queimar o coração" dos dois, enquanto caminhavam "com o rosto triste" (cf. Lc 24, 13-35). Apesar de não reconhecer Jesus ressuscitado, durante o trajeto feito juntamente com ele, eles sentiram o coração "arder no peito", retomar a vida, de modo que, ao chegarem a casa, "insistiram" para que permanecesse com eles. "Fica conosco, Senhor": é a expressão do desejo que pulsa no coração de todo o ser humano. Esse desejo de "coisas grandes" deve se transformar em oração. Os Padres sustentavam que rezar não é outra coisa senão o anseio de se transformar em um só com o Senhor. Em um belíssimo texto, Santo Agostinho define a oração como expressão do desejo e afirma que Deus responde alargando o nosso coração em relação a Ele: "Deus [...] suscitando em nós o desejo, expande a nossa alma; e expandindo a nossa alma, a torna capaz de acolhê-lo" (Comentário à Primeira Carta de João, IV, 6). De nossa parte, devemos purificar nossos desejos e nossas esperanças para acolher a doçura de Deus. "Esta – continua Santo Agostinho - é a nossa vida: exercitar-se no desejo" (Ibid.). Orar a Deus é um caminho, uma escada: é um processo de purificação dos nossos pensamentos, dos nossos desejos. A Deus, podemos pedir qualquer coisa. Tudo aquilo que seja bom. A bondade e o poder de Deus não conhecem limites entre as coisas grandes e pequenas, entre coisas materiais e espirituais, entre coisas terrenas e celestes. No diálogo com Ele, levando toda a nossa vida diante de seus olhos, aprendemos a desejar as coisas boas, a desejar, no fundo, o próprio Deus. Diz-se que, em um dos seus momentos de oração, Santo Tomás de Aquino sentiu o Senhor crucificado lhe dizer: "Tens escrito bem sobre mim, Tomás; o que queres?". "Nada além de Ti", foi a resposta do Santo Doutor. "Nada além de Ti". Aprender a rezar é aprender a desejar, e, assim, aprender a viver.

A cinco anos depois da morte de monsenhor Luigi Giussani, o Sumo Pontífice une-se espiritualmente aos membros do Movimento de Comunhão e Libertação. Como ele pôde recordar durante a Audiência na Praça de São Pedro, em 24 de março de 2007, "monsenhor Giussani comprometeu-se a despertar nos jovens o amor a Cristo 'Caminho, Verdade e Vida', repetindo que só Ele é o caminho para a realização dos desejos mais profundos do coração do homem".

Ao confiar aos participantes do Meeting essas reflexões, esperando que ajudem a conhecer, encontrar e amar sempre mais o Senhor e testemunhar no nosso tempo que as "grandes coisas" que desejam o coração humano encontram-se em Deus, Sua Santidade Bento XVI assegura a Sua oração e de bom grado envia a Vossa Excelência, aos responsáveis e organizadores e a todos os presentes a Bênção Apostólica.

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